Em Betim, existe um lugar único. Melancólico. Sofrido.
Quando se avista o pequeno lugarejo, tenho a sensação de que estou numa cidadezinha interiorana, miúda em sua extensão, simples nos seus casebres, triste e devagar. O olhar dos seus moradores reflete uma consternação doída. Desmedida.
Já havia algum tempo que eu não ia lá, nas costumeiras tardes dos sábados de meses pares. Um grupo, muito especial, faz o que chamamos de "tarefa assistencial" e percorre as enfermarias e casas com o objetivo de aliviar a dor, a solidão, o desamparo.
Ao chegar no Centro Irmã Scheilla, o grupo se divide em dois: um visita a enfermaria e o outro vai às casas. Desta vez, diferente das outras, escolhi ir aos lares.
O primeiro deles é a casinha verde, em frente ao Centro, que ainda está no reboco, sem laje, coberta por um telhado colonial. Logo na entrada, uma menininha simpática, dos seus 7 anos nos recebe com um olhar curioso e admirado. Ao entrar na casa, me deparo com o Júnior - um menino de 15 anos, tomando colheradas de pão sovado no leite, dadas por sua mãe. Sua mãe não tem mais que 36 anos.
O Júnior tem
paralisia cerebral. A mãe do Júnior tem
aids. Sua avó tem
hanseníase. Eu fiquei fascinada pelo olhar do Júnior. Ele tem rosto de anjo. Cabelos negros, tão pretos como os seus olhos. E uma inquietação que pedia afago, carinho.
Coloquei minhas mãos sobre suas costas e comecei a conversar com ele. Eu queria muito que ele me entendesse. Era como se eu quisesse me escutar. Ou escutá-lo. Entender. Compreender.
Não consegui conter minhas lágrimas. Abracei a mãe do Júnior e chorei feito criança. Fiquei envergonhada com meus problemas, que são tão pequenos, tão medíocres, tão sem sentido.
Depois da casinha verde, veio a casa amarela-suja, a casa azul-desbotada, a casa-rosa da Dona Cecília e mais algumas outras.
Tantas casas. Tanto sofrimento. Tanta dor. Mas, todas elas, todas essas casas tinham uma coisa impressionamentemente comum: A fé em Deus. A aceitação resoluta da sua condição.
Sem palavras para encerrar o texto.
...
A Colônia Santa Izabel foi construída com a finalidade de abrigar os enfermos de hanseníase em regime de confinamento obrigatório, seguindo a política sanitarista adotada pelo país na década de XX.
Seu projeto arquitetônico era semelhante a de uma pequena cidade e foi construída para ser o segundo maior centro de tratamento de hanseníase (conhecida popularmente como lepra) no país.
Hoje, a Colônia além das enfermarias, tem ao seu redor moradores portadores da hanseníase.